O que não te disseram sobre escapes quando te ensinaram sobre extrassístoles

Blue Stethoscope on electrocardiogram (ECG) chart paper. ECG hea

Como escapar da cilada de não identificar um escape no eletrocardiograma? E olha que é uma cilada mesmo, viu? Não é raro observarmos no dia a dia colegas confundindo batimentos de escape ventricular ou supraventricular, com extrassístoles. Mas vamos por partes, ok?

Primeiramente, já sabemos o que são extrassístoles: batimentos, na maioria das vezes, gerados por mecanismos de reentrada, fazendo com que um batimento de origem ventricular, atrial ou juncional apareça de repente no traçado. Em boa parte das vezes, esses batimentos aparecem atropelando o que seria o ritmo normal do coração, que tende a ser uma “marcha militar” – você concorda? -, com cada intervalo R-R variando bem pouco, até que de repente surge um batimento ‘’extra”.


Figura 1: Retomando o conceito de extrassístole. Neste caso, temos umas extrassístole ventricular, um batimento precoce com QRS com morfologia e duração diferentes dos batimentos normais.

 

Agora que relembramos este ponto importante, vamos aos batimentos de escape. Achou que ia escapar, né? Ok…ok…sem mais trocadilhos sobre escapes. O que ocorre é que, em alguns momentos do ciclo cardíaco, sobretudo em pacientes com algum grau de cardiopatias – como é o caso de coronariopatas -, o sistema elétrico do coração pode falhar na geração de algum batimento e alguém precisa assumir o comando.

Por exemplo, quando o nodo sinusal falha, o nodo atrioventricular pode vir ao resgate, gerando um batimento que mantém uma similaridade morfológica ao ritmo juncional, mas sem ondas P. Nesse caso, teremos um escape supraventricular (nascendo acima do feixe de His).


Figura 2: Cardiomiopatia isquêmica.

 


Figura 3: Batimento de escape juncional. Perceba o atraso ou a demora do segundo batimento em aparecer no traçado. O escape por natureza é um batimento tardio.

 

Os batimentos de escape juncional geralmente se originam na junção AV, em ritmos bradicárdicos, com FC menor que 50 bpm. Eles também são observados após episódios de bloqueios atrioventriculares.

Uma das principais diferenças, portanto, que nos ajudam na hora de diferenciar extrassístoles de batimentos de escape, é justamente essa pausa que ocorre após o último batimento normal. Concorda que na figura acima, se após essa pausa, não viesse algum batimento de escape – nesse caso foi juncional (sem ondas P, logo não nascendo no tecido atrial ou nodo sinusal) -, entraríamos em assistolia? O termo “escape” faz juz ao fenômeno eletrofisiológico… Realmente, o coração escapa de entrar num ritmo de PCR.

Às vezes, esse fenômeno pode ocorrer num cenário mais fisiológico, como em casos de tônus vagal exacerbado, durante o nosso sono por exemplo: ficamos mais bradicárdicos, tônus vagal aumentado, vem um período de pausa maior entre os batimentos e surge um batimento de escape! Ah, detalhe, sem necessidade de qualquer tipo de tratamento, diga-se de passagem.

Figura 4: Escape juncional. É comum a ocorrência durante o sono, quando o tônus vagal está aumentado e acaba diminuindo a frequência de impulsos do nó sinusal.

 

Em casos de escapes ventriculares, observamos um QRS alargado (maior que 120 ms, ou três quadradinhos), visto que o impulso não pode ser transmitido rapidamente pelo sistema de condução elétrica normal.


Figura 5: Batimento de escape ventricular. Batimento tardio, com QRS com morfologia distinta do batimento normal e com duração aumentada.

 

Esse fenômeno eletrofisiológico é tão interessante, que de certa forma, é possível até reproduzi-los artificialmente em pacientes com marca-passo. Conseguimos programar o dispositivo de forma que ele assuma o ritmo cardíaco do paciente em cenários em que a frequência cardíaca fica muito baixa.

Mas isso será tema de outro capítulo. Até a próxima.

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